6450–10

Sem terminal.

Anna Liz de Oliveira
1 min readMay 13, 2022

--

Escrevo pra mim
Coisas que não conto a ninguém
Nem mesmo pra dona senhora
Ângela
Do ônibus
E do jardim
Que disse que queria muito
Ouvir tudo
As todas lamúrias
Que eu tenho pra contar

Ah, fia. O mundo é assim mesmo
Mas não desista, não
Que o que é teu
Tá guardado

Não sei onde, então
Dona Ângela
Eu perdi esse meu que nunca achei
Devo ter esquecido
Muito bem guardado
Em algum canto do coração de alguém
Que não soube cuidar

E agora? Como pego de volta?
Não tem volta
Só as do mundo mesmo
Que não para de girar
Girar
Girar
Quero descer.
O ônibus ainda não parou
Nem o mundo

Fia, ocê tá branca que só
E a dó no olhar
Aquela piedade
Que só vó que tem
E que eu nem tive
Porque a minha partiu antes
Bem antes de ganhar aquele abraço

Pela janela é só tristeza
Mas dentro, dentro é bem pior
Não tem prato de comida
Que preencha o vazio todo
Da coisa que perdi
Que nem sei onde
Deixei por aí
Com a minha vontade toda
De continuar a andar pela cidade
Sem fim
Que nem essa poesia
Torta
E sem final também.

…………………………………

Arte de capa: Brian Degnon.

--

--

Anna Liz de Oliveira

Educadora, bióloga, ativista e escritora, poetizando lutas e paixões da ponte pra cá. @poetaperiferica